2.7.09

O Marcelo, Décima Oitava e Última Parte

Afastámo-nos do rio de braços dados. Palavra, dados. Assim fomos até à porta de sua casa. O vinho e a noite e eu fizeram-me dizer coisas que talvez não devesse ter dito, muito menos no tom em que as disse. Mas era noite e a Mariana só riu, sorriu e chamou-me tolinho. Despedimo-nos com um beijo. Era de noite, eu era tolinho, foi um bom beijo. Prometi-lhe ganhar mais concursos da rádio e fiquei a dizer adeus com a mão até a porta se fechar.

Não me apetecia voltar para casa. Tinha ganas de cantar alto, dançar, pular e dizer muitas vezes Mariana. O ridículo não mata quem ama, nada mata quem ama. Corri pela rua de braços abertos até me cansar e ficar sem ideias. Voltei para casa.

Entrei e procurei pelo Marcelo, se dormisse acordava-o, em dias assim os amigos imaginários não têm direito ao sono. Podia simular um tropeço e desculpar-me pelo barulho. Ele começa a fazer perguntas e eu faço-me rogado... “não deixa, falamos amanhã” assim até ele rebentar e me obrigar a despejar tudo, mesmo os pormenores. Sobretudo os pormenores. Onde parava o danado?

Sala, quarto, cozinha, varanda. Nada de Marcelo. Por onde andaria a estas horas? Provavelmente enfiado numa sala de jogo, a beber dos copos por uma palhinha. Ou então num bar de strip, onde a sua invisibilidade lhe proporcionava enormes desafios à imaginação.
Sentei-me e descalcei os sapatos. Procurei os chinelos do pato Donald mas não os encontrei. Espreitei para debaixo da cama e não os vi. Não vi os chinelos nem a mala de viagem nem os maços de notas que ela continha. Apenas um envelope, dentro um bilhete e uma nota grande.

Parabéns Alfredo, a rapariga tem mais méritos do que eu pensava, se não tens cuidado ainda faz de ti um homem.
Desapareci, como já deves ter percebido. Foi o que me pediste, não foi? Para dizer a verdade até me caiu a jeito, tenho sítios para ir. Tive o cuidado de levar a mala e o dinheiro, cada um com os seus ganhos. A mim sobram-me as paixões e a ti não te serve o dinheiro. Essa nota é para comprares outros chinelos e outro pijama, afeiçoei-me às riscas amarelas.
Se precisares de mim é só sonhar-me, mas poupa as fantasias. Muda de quiosque se for preciso, muda de cidade ou muda de vida mas não gastes as fantasias.
Agora vou para onde tenho de ir. Nada de ressentimentos rapaz, sobretudo nada de ressentimentos...
Marcelo



Fim

2 comentários:

 
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