25.7.11

Celeste

Eram sete homens loucos à volta de um homem são, e diziam adeus. Vestiam pijamas à volta dele, abraçavam-no, tocavam-lhe com as mãos e sorriam ou choravam. Ele chamava-os pelos nomes secretos que tinham, Jesus, Belzebu, Salazar, Sebastião, nomes de guerra e de ser louco, de fugir com as ideias de uma cabeça doente.
Ele de mala na mão, corpo direito e lágrimas verticais, “a seguir são vocês… Tu, Rasputine, tu também, Madalena, a seguir são vocês.”Cá fora a família que espera, alegria e medo, quem és tu agora que a nós voltas, por onde andaste, quanto de ti te resistiu? Olhos limpos a adivinhar o mal escondido nos pijamas e nas árvores do jardim.Ele dá dois passos e olha para trás, mais quatro e alguém corre até ele. Salomé puxa-o pelo ombro e abraça-o com um cheiro íntimo, “tenho uma coisa para ti, para que te lembres de mim e de nós, para que possas voltar se o dia não te quiser.” Uma pequena caixa azul na mão, “adeus, adeus.”Atravessa o pátio e o portão, cumprimenta a mãe, o pai e o irmão, um último aceno e entra no carro. A caixa em cima dos joelhos, uma música a tocar no rádio e o silêncio nos lábios. Os dedos percorrem as arestas azuis, lentamente, como um gatilho. Ele sabe o que vai dentro porque já lá viveu, alguém abriu e alguém fechou. Ele sabe, porque é ele que lá vai dentro.


(Publicado no Pnet Literatura:  http://www.pnetliteratura.pt/cronica.asp?id=3623)

 
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