31.10.09

Rua Escura I



cães escuros a lamber os cantos da cidade,

línguas ásperas feitas às pedras e ao resto.

Manda os olhos e o medo por onde os pés não vão,

vidas por todo o lado.

abrigos órfãos de luz

onde a solidão se come às mãos cheias

e se canta baixinho para não acordar os vivos.

fomes que se matam escondidas.

As vozes e o querer dobram esquinas, a luz não.

De dia é fácil ser homem por entre os homens,

o dia é avenida do tempo, rua direita.

À noite o corpo tem pés ligeiros e surdos

e o tempo faz-se de muitas horas compridas.


(Ilustração de Marco Mendes)

4 comentários:

  1. Há fomes impossíveis de esconder e que, se saciadas originarão mais fome. Desastre. Quem sabe até, insanidade. É impensável não temer fomes assim.

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  2. Um texto magnífico.
    Os meus parabéns.
    Fez-me lembrar uma frase que Ernest de Hemingway disse um dia a um jornalista:
    "À noite, no meio da solidão, todos acreditamos em Deus".

    Um excelente trabalho neste post. Mais uma vez parabéns.

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  3. a noite esconde os "os outros homens", as outras vidas ... os que a nossa hipocrisia , politicamente aceite, teima esquecer
    as palavras continuam muito intensas
    :)

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