Começaram os ensaios. O Marcelo ensinava e eu tentava cumprir da melhor maneira possível. Primeiro foram as regras, simples mas cheias de subtilezas, dessas que fazem um bom jogo. Seguiram-se depois as diferentes estratégias ofensivas e defensivas e algumas manobras de diversão. Desde que o conhecia nunca o tinha visto tão sério e tão compenetrado, irritava-se facilmente com a minha inépcia e repetia tudo mais depressa e com raivas na voz. Quando me apanhava distraído mandava um berro e depois proferia discursos que me pareciam desproporcionados “O póquer, como qualquer jogo, é uma guerra. Mais importantes do que as armas com que te bates é a coragem que tens ou que inventas e teres a cabeça limpa para ver o que os outros descuidam”. Ensinou-me a não beber durante os jogos, mas a fingir que bebia. Uma garrafa de bolso cheia de sumo de maçã e um “ahhh” curto depois de cada gole.
A parte final do treino foi dedicada ao corpo e à expressão. Eu nunca imaginara a importância que poderia ter a distância entre o corpo e a mesa, ou o ângulo dos cotovelos ou mesmo o entrelaçar dos dedos. Ainda mais decisivo era tudo o que ficava do pescoço para cima. O Marcelo explicou-me detalhadamente e como se fosse um segredo o seu modelo dos sete sorrisos e doze olhares. Segundo ele, a perfeita combinação entre uns e outros era capaz de provocar os mais variados efeitos num adversário. Uma ida à casa de banho, uma comichão no nariz, um arrepio no fundo das costas... Todo o tipo de distracções e condicionamentos físicos e mentais passíveis de inverter o delicado equilíbrio de forças.
O curso durou uma semana em que pouco dormi. Nas poucas horas em que o consegui fazer sonhei com cartas e homens de bigodes ensopados em whisky. Imaginava sequências e bluffs épicos durante as horas de trabalho e mesmo enquanto comia dava por mim a praticar o olhar com os outros clientes do snack-bar.
Quando a semana terminou eu sentia-me já um jogador, um ilusionista das possibilidades, como dizia o Marcelo. Estava pronto para a batalha.
A parte final do treino foi dedicada ao corpo e à expressão. Eu nunca imaginara a importância que poderia ter a distância entre o corpo e a mesa, ou o ângulo dos cotovelos ou mesmo o entrelaçar dos dedos. Ainda mais decisivo era tudo o que ficava do pescoço para cima. O Marcelo explicou-me detalhadamente e como se fosse um segredo o seu modelo dos sete sorrisos e doze olhares. Segundo ele, a perfeita combinação entre uns e outros era capaz de provocar os mais variados efeitos num adversário. Uma ida à casa de banho, uma comichão no nariz, um arrepio no fundo das costas... Todo o tipo de distracções e condicionamentos físicos e mentais passíveis de inverter o delicado equilíbrio de forças.
O curso durou uma semana em que pouco dormi. Nas poucas horas em que o consegui fazer sonhei com cartas e homens de bigodes ensopados em whisky. Imaginava sequências e bluffs épicos durante as horas de trabalho e mesmo enquanto comia dava por mim a praticar o olhar com os outros clientes do snack-bar.
Quando a semana terminou eu sentia-me já um jogador, um ilusionista das possibilidades, como dizia o Marcelo. Estava pronto para a batalha.
(continua)
Nuninho gosto mesmo de ler os teus contos caraças! Embora seja o meu primeiro comentário tenho seguido tudo e com grande satisfação, tens mesmo jeitinho. beijinhos
ResponderEliminarRita (a tua irmã)